LinkedIn: uma rede social para uma humanidade artificial.
Estamos vivendo uma época de descobertas em relação à inteligência artificial. Preocupações em relação ao mercado de trabalho são bastante recorrentes; trabalhos criativos estão se tornando alvo da concorrência de geração de texto e imagens, e profissões até das mais técnicas estão sendo aceleradas, com risco de substituição, como os programadores ou analistas de negócios. Para ser sincero, na preguiça de escrever aqui, considerei terceirizar o texto pro ChatGPT, mas achei que seria muita cara de pau. Valorize meu esforço e leia até o final.
Nesse contexto de risco de substituição iminente, o trabalhador tem lutado para se provar no mercado de trabalho. De certa maneira, existe uma similaridade com um certo movimento ludista do passado, em que nós vemos hoje, por parte do trabalhador, uma revolta, ainda que mais comedida, em relação a essas possíveis ameaças e um discurso de reforço da importância do toque humano na inteligência empresarial. Nosso atual presidente reforçou a mensagem na metade do ano passado:
“Se a inteligência artificial vier para melhorar a nossa condição de trabalho, para aumentar a densidade de ganho de dinheiro da Petrobras, se a inteligência artificial ajudar o ser humano a ser mais humano, que seja bem-vinda. Mas, se não fizer isso, nós ficamos com a nossa inteligência. Eu não troco vocês todos por uma inteligência artificial que eu ainda não conheço, e vocês eu conheço bem” — uma fala de Lula em 19 de junho de 2024.
Nada melhor que o nosso próprio presidente para reforçar o discurso dos trabalhadores brasileiros com essa defesa dos valores humanos e da nossa inteligência humana. Infelizmente, minha experiência no LinkedIn brasileiro não reforça nada disso e até se torna uma crítica à inteligência humana. Talvez a Skynet tivesse razão. Caso você seja jovem demais e não conheça o que é Skynet, esse é o nome da inteligência artificial que se julga superior à humanidade e decide começar uma guerra das máquinas contra os humanos na franquia Exterminador do Futuro. Caso tenha interesse em conhecer ou revisitar a franquia, assista apenas aos 2 primeiros filmes e considere que não existem outros filmes depois. Não precisa me agradecer.
Tenho usado o LinkedIn com mais frequência para tentar resolver uma demanda por transparência no mercado financeiro — inclusive, pode ser um texto futuro para o site aqui —, mas, por enquanto, vou me limitar apenas a descrever a motivação. Quando você já fez aquilo que tinha que fazer, volta para a página inicial e entra na chamada linha do tempo de publicações, que mostra as postagens mais recentes. É aqui que reside o absurdo do LinkedIn e algumas jabuticabas que o site só apresenta no Brasil.
O primeiro elemento gritante no LinkedIn brasileiro é a baixa propensão ao compartilhamento de publicações relativas à técnica e inovações, sejam elas de pesquisa, indústria ou comércio. Nesse sentido, pelo que converso com aqueles que usam bastante o LinkedIn e olham para o mercado lá fora, o feedback que tive é que isso é uma exclusividade do Brasil em relação ao LinkedIn global.
A segunda exclusividade brasileira — mais absurda ainda — é o compartilhamento de publicações de cunho político que em nada servem para alguma questão profissional. O fato de você realmente odiar muito, ainda por cima em público, o Bolsonaro não deve te conseguir nenhum emprego, principalmente se você tiver que atender públicos distintos na sua jornada profissional. O Lula também não — antes que você me acuse de ser partidário nesse aspecto. O fato é que, literalmente, metade da população votou em cada candidato, e não há motivo estratégico para gerar um posicionamento que pode causar um enfrentamento com metade da população do Brasil. Espero que essa mensagem chegue àqueles que defendem a democracia no LinkedIn.
O desvirtuamento das virtudes em nome do engajamento
O terceiro ponto em relação ao LinkedIn é, de longe, o pior — e é o motivo que me fez escrever este texto. Tenho orgulho de dizer que, nesta parte, o Brasil não está sozinho. Nada é tão ruim quanto o que eu vou escrever agora. As publicações do LinkedIn estão tentando reproduzir valores humanos como empatia e compaixão em busca de engajamento. Por si só, isso não seria negativo. Em alguns exemplos, vemos uma tentativa de tornar a vida pessoal um elemento de análise corporativa, como imortalizado em uma publicação de um antigo vice-presidente da Amazon, Ethan Evans, cuja esposa o traiu com um chefe de uma empresa em que ele trabalhava, e ele usou isso para falar sobre ambientes corporativos perigosos, cheios de “cobras corporativas”. De fato, a esposa dele se envolveu com a “cobra corporativa” em cheio. Ethan precisa de uma estratégia mais saudável para lidar com o trauma do que escrever no Substack e repostar no LinkedIn.
O texto de Ethan Evans está em inglês, e você pode se horrorizar por completo com o texto na íntegra em: https://levelupwithethanevans.substack.com/p/my-ceo-seduced-my-wife
O corno do LinkedIn talvez seja um excesso da visão de tornar tudo uma oportunidade de crescimento pessoal corporativo — e também de compartilhamento da vida pessoal em redes sociais. Algo mais comum, e não tão extremo, é a recorrência de processos seletivos angelicais: um comportamento fantasioso e mentiroso de pessoas que estão sistematicamente sempre contratando e, todo dia, tendo experiências de superação, compaixão e empatia entre todos os envolvidos. A preguiça nessas publicações é tão grande que os influenciadores de empatia no LinkedIn literalmente republicam os textos uns dos outros como se fossem sua experiência pessoal. Ou seja, na mesma semana, todo mundo entendeu que precisaria remarcar a entrevista para um dado candidato por questões de imprevistos ou por falta de condições socioeconômicas. Todos esses candidatos ficaram muitos anos na empresa e geraram muito valor. No geral, o LinkedIn brasileiro parece uma experiência de sinalização de virtudes e não de compartilhamento de melhores práticas em relação ao segmento em que a pessoa trabalha.
LinkedIn como ferramenta de transparência
O trabalho que tenho feito através do LinkedIn é justamente uma das melhores práticas de transparência do mercado financeiro e seria o tipo de coisa que deveria ser compartilhado — mas, ao mesmo tempo, com o atual alcance da minha página, eu apenas estaria entregando de bandeja uma boa prática e não haveria clientela que aproveitasse o conteúdo. Fica aqui uma ideia: talvez o LinkedIn deva ser menos usado para estar em contato com vagas de emprego e mais para achar a sua clientela.
Quer engajamento ou quer entregar resultado? Porque empatia real não precisa de legenda
Refletindo sobre essa tentativa dos influencers de LinkedIn em simular empatia nas suas publicações, minha experiência pessoal sugere que o mercado financeiro tem mais empresas dispostas a fazer um verdadeiro processo empático de contratação, porque as empresas, em sua maioria, entendem que a geração de valor é aquilo que importa e que questões culturais podem ficar em segundo plano — o que gera entrevistas mais transparentes sobre o que será entregue de valor e a remuneração adequada. Posso estar enganado e ter sido muito sortudo, mas todas as empresas com que tive contato foram bastante transparentes. Talvez isso se perca conforme as empresas cresçam de tamanho, e talvez seja um benefício de já ter mais de 7 anos neste mercado, mas, no geral, parabenizo todos com quem já tive contato no passado.
Também quero reforçar que existem bons profissionais no mercado que falam sobre gestão de recursos humanos no LinkedIn, vários deles sendo autores renomados no assunto e que têm livros publicados bastante relevantes. Para eles, não está sendo feita nenhuma crítica.
Esta crítica fica direcionada apenas àqueles que acham normal copiar e colar textos de engajamento fácil do tipo “ajudei o pobre candidato a fazer uma entrevista mais tarde porque sou uma pessoa fantástica”, semanalmente. Não deveria nem ser fato compartilhável o recrutador se achar incrível por ter uma capacidade mínima de compreensão em relação a imprevistos na vida daqueles que querem se recolocar no mercado de trabalho.
Por fim, fica meu apelo por um LinkedIn mais saudável.
Quero saber, de fato, o que de novo vocês estão trazendo para as empresas: as boas práticas, inovações, comemorar o sucesso e crescimento de todos. Me falem do empreendedorismo de vocês, da jornada, dos sucessos e fracassos dessa aventura. Me falem do curso de análise de dados que vocês iniciaram, mesmo não sendo da área, e como isso complementa o trabalho atual de vocês.
Quero também pedir aos outros usuários que parem de copiar e colar conteúdo alheio, parem de compartilhar que vocês tomaram chifre na rede social voltada para o mercado de trabalho, parem de cobrar as empresas por um emprego marcando todas elas, parem de compartilhar o posicionamento político de vocês, parem de contar histórias de generosidade que nem sequer se aplicam ao ambiente empresarial. Vocês não serão contratados por isso.
Meu pedido final é que você compartilhe esse texto com outras pessoas. Estamos precisando, urgentemente, de um uso consciente do LinkedIn — sem excessos, respeitando os limites de cada indivíduo, referentes aos efeitos que o uso da plataforma tem sobre a mente e o corpo.

João Grassini
Administrador de Empresas (UFRGS),
Assessor de investimentos na Marco Investimentos, Coordenação de investimentos em Renda Fixa e Fundos